O imbróglio que envolve a regulamentação do piso da enfermagem no Brasil pode ter mais um capítulo nesta semana. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que vai pautar a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 390/14 para amanhã. A matéria trata sobre o custeio dos salários dos profissionais nos estados e municípios.
“Na próxima sessão do Senado Federal, nós apreciaremos a proposta que viabilizará o piso nacional da enfermagem numa solução que haveremos de construir com o Supremo Tribunal Federal, para que esse piso nacional se torne uma realidade no Brasil”, disse Pacheco, durante sessão da última sexta-feira no Congresso.
Na semana passada, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou, em dois turnos, a PEC que busca viabilizar o custeio do piso salarial da enfermagem. Uma sugestão de mudança ao texto foi rejeitada e, agora, está sob apreciação do Senado. A proposição direciona recursos do superávit financeiro de fundos públicos e do Fundo Social para financiar o piso salarial nacional pelo Sistema Único de Saúde (SUS), entidades filantrópicas e outros prestadores de serviço que comprovem pelo menos 60% do atendimento de oriundos do programa.
“Poderão ser utilizados como fonte para pagamento da assistência financeira complementar de que trata o § 15 do art. 198 da Constituição Federal os recursos vinculados ao Fundo Social de que trata o artigo 49 da Lei nº 12.351, de 22 de dezembro de 2010, ou de lei que vier a substituí-la, sem prejuízo à parcela que estiver destinada à área de educação”, estabelece a PEC.
A proposição ainda fixa um prazo de transição para que essas despesas sejam consideradas gastos com pessoal. No primeiro ano, esses valores não seriam incluídos nessas despesas. Com isso, a Lei nº 14.314/2022 voltaria a vigorar.
O piso da enfermagem foi suspenso no país devido a uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso. Ele determinou que a União e entes públicos e privados se manifestassem sobre o assunto. As partes deveriam informar o impacto financeiro do piso salarial, os riscos para a empregabilidade na área, além da possibilidade de eventual redução na qualidade dos serviços prestados na rede de saúde.
Na decisão, o magistrado concordou com o argumento das entidades privadas de que o Legislativo e Executivo aprovaram e sancionaram o projeto sem cuidarem das providências que viabilizariam a sua execução, como, por exemplo, o aumento da tabela de reembolso do SUS à rede conveniada.
A lei que regulamenta os salários foi sancionada em 4 de agosto deste ano pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e estabelece o piso de enfermeiros em R$ 4.750, 75% desse valor para técnicos de enfermagem e 50% para auxiliares de enfermagem e parteiras.
Barroso argumentou que a criação do piso sem uma fonte de recursos segura acarretaria em demissões no setor e colocaria em risco a prestação de serviços de saúde, uma vez que os hospitais filantrópicos e Santas Casas chegaram a divulgar que precisariam demitir cerca de 83 mil funcionários para manter o funcionamento.
Custos
Segundo o relatório apresentado pela deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), relatora do projeto, o piso está calculado com custo total em torno de R$ 18 bilhões. O mesmo documento mostra que o balanço patrimonial da Secretaria do Tesouro Nacional referente a 2021 calculou o superávit financeiro dos fundos da União naquele ano em R$ 20,9 bilhões, dos quais R$ 3,9 bilhões se referem à parcela do Fundo Social destinada à saúde pública e à educação.
“Em 2022, a Secretaria do Tesouro Nacional divulgou o seu balanço patrimonial de 2021, em que foi estimado que o superávit financeiro dos fundos da União para aquele exercício financeiro foi de R$ 20,9 bilhões, sendo que R$ 3,9 bilhões se referem a parcela do Fundo Social (FS) destinada à saúde pública e a educação”, afirmou a relatora.
“Ressaltamos ainda que a União conta com R$ 40 bilhões de recursos primários de livre aplicação. O montante de despesas necessárias ao pagamento do auxílio financeiro previsto pela PEC 27/22, está estimado em R$ 18 bilhões”, comparou.
As entidades de classe acreditam que a aprovação seria uma reparação histórica para uma categoria que esteve na linha de frente da pandemia. “A enfermagem, esse grande contingente de trabalhadores e trabalhadoras, a maioria mulheres, aguarda há meses a implementação da lei já votada e sancionada por esta Casa”, defendeu Alice Portugal.
Na última semana, a deputada federal Carmem Zanotto (Cidadania-SC) manifestou à presidente do STF, Rosa Weber, a intenção de apresentar ao ministro Barroso um pedido de suspensão da ação, pois a proposta que tramita no Congresso seria a solução para a questão do financiamento do piso. “Falamos sobre todos os encaminhamentos das fontes de financiamento para o piso nacional e mostramos que a Câmara fez a sua tarefa. Agora a PEC 27/22 deverá ser votada no Senado e depois será promulgada”, disse a parlamentar.
“Estamos a poucos dias de resolver o sonho de uma categoria. Temos o compromisso do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, de que a PEC será votada ainda na terça. Uma vez promulgada, iremos até o Supremo para pedir a extinção da decisão que suspendeu o piso nacionalmente”, disse o deputado federal eleito Bruno Farias (Avante—MG), presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) de Minas Gerais.
A proposta para garantir o custeio de parte dos recursos para o piso foi apresentada em 8 de novembro. Ela foi anexada a um outro projeto que tratava da ampliação do limite de despesas com pessoal ativo nas áreas da saúde e da educação, apresentada ainda em 2014, mas que não tramitou no Congresso.
A aprovação na Câmara também foi comemorada por outros parlamentares. “Após anos de luta, os profissionais da enfermagem foram reconhecidos. Ontem à noite foi aprovada em dois turnos na Câmara a PEC que garante o pagamento do Piso Nacional da Enfermagem”, declarou o deputado Paulo Pimenta (PT-SC) via redes sociais.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN) disse que vai atuar para que o projeto seja aprovado no Senado. “Estamos cada vez mais próximos de aprovar definitivamente o piso salarial da enfermagem! A Câmara votou o projeto e agora ele segue para o Senado, onde lutaremos para promover a articulação necessária e finalmente garantir o reconhecimento do piso da categoria”, afirmou.