O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega acredita que o ambiente nunca foi tão favorável para a aprovação da reforma tributária, que traz como principais pontos a fusão de tributos e criação de um imposto sobre valor agregado (IVA) cobrado no destino.
Para o economista, ao lado da má qualidade da educação no Brasil, das deficiências da infraestrutura e dos juros altos, o manicômio tributário na área de consumo é um dos grandes responsáveis pelo baixo crescimento do país.
“O Brasil tem o pior sistema de tributação do consumo e estamos diante da maior oportunidade para pôr fim a esse caos. Sabemos que a base de incidência do ICMS encolhe cada vez mais. Então, a melhor alternativa para os Estados é aderir a um projeto avançado e moderno de tributação do consumo”, afirmou, durante audiência pública realizada na Câmara dos Deputados pelo Grupo de Trabalho sobre Reforma Tributária.
Maílson se referiu às PECs 45 e 110, que tramitam no Congresso Nacional e que servirão de base para a proposta a ser apresentada pelo governo nos próximos meses. Nem todos os convidados da audiência, porém, são favoráveis aos textos das propostas em discussão. Na visão da tributarista Mary Elbe Queiroz, antes de reformar o sistema tributário, é preciso rever o que se gasta, como se gasta e a qualidade desse gasto.
“Pode ser que a reforma não mexa na carga tributária, que já é alta, mas poderá aumentar tributos. Então, enquanto nós não revermos o lado do gasto, da despesa, nós não teremos uma reforma tributária que mantenha o mesmo nível de arrecadação, como apregoam os textos”, alertou a especialista, que também chamou a atenção para o prazo de transição de 10 anos, em que os contribuintes deverão conviver com dois sistemas.
Para a tributarista, as propostas também não atacam a questão da não cumulatividade dos impostos. A Constituição Federal, explicou, é omissa nesse tema e os textos das propostas não tratam com clareza o que são insumos e o conceito da essencialidade. “Mais de 50% dos processos de litígio, hoje, versam sobre a questão de não-cumulatividade”, lembrou.
SIMPLES NACIONAL
Durante o debate, a tributarista alertou que as propostas em tramitação no Congresso Nacional põem em risco o tratamento diferenciado para as micro e pequenas empresas do Simples Nacional, pois mantém a vedação aos créditos, tirando a atratividade atual do regime tributário, além de aumentar a carga tributária para os prestadores de serviços.
“Os textos dizem que o Simples será mantido. Mas como mantê-lo vedando o direito a crédito”, indagou. De acordo com ela, com a redação atual das propostas, a opção será sair do regime tributário, pois se tornará oneroso para os pequenos negócios, atingindo em cheio os empregos.
“É preciso analisar com cautela as propostas e fazer ajustes profundos sob o risco de, daqui a cinco anos, precisarmos reformular novamente o sistema tributário”, concluiu.
AGENDA ARTICULADA
Na opinião de Isac Moreno Falcão, presidente do Sindifisco, os objetivos pretendidos com a reforma tributária só serão atingidos se houver uma articulação das agendas da tributação sobre o consumo, renda e patrimônio, além de uma reformulação da administração tributária, que faça funcionar as modificações legislativas de forma efetiva e dê conta do contencioso tributário.
A ideia do governo é alterar primeiro os tributos que incidem sobre o consumo – que representam quase 50% da carga tributária total – deixando a tributação sobre a renda para uma segunda etapa.
O auditor também chamou a atenção para a necessidade de reduzir a informalidade para que a implantação do cashback, mecanismo que prevê a devolução do imposto para as famílias de baixa renda, seja bem-sucedido. “Cerca de 95% dos beneficiários do Bolsa Família do Maranhão compram produtos no mercado informal”, exemplificou.
A mesma opinião sobre os riscos da fragmentação da reforma tributária foi compartilhada pelo professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Eduardo Fagnani.
Na sua opinião, dar prioridade à simplificação dos impostos sobre o consumo pode não caminhar em direção à necessária redistribuição das bases de incidência da tributação. Isso pode, inclusive, ampliar ou manter como está a carga sobre o consumo.
Com o IVA, a carga sobre o consumo será de cerca de 25%, uma das maiores do mundo. Na União Europeia, disse o especialista, essa taxa é cerca de 21% e na OCDE, gira em torno de 19%.
“A redução dos impostos sobre o consumo e ampliação da tributação sobre a renda são faces da mesma moeda”, concluiu.