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Polêmica, MP da reoneração da folha de pagamento é publicada
Objetivo é manter o orçamento equilibrado em linha com a meta de déficit primário zero. Porém, fim da desoneração causou mal-estar no Congresso e entidades empresariais, que apontaram 'risco aos empregos'
02/01/2024
Diário do Comércio da Associação Comercial de São Paulo

O governo federal publicou a Medida Provisória 1.202, que trata do conjunto de medidas anunciadas nesta quinta-feira, 28, pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para manter o orçamento de 2024 equilibrado, ou seja, em linha com a meta de déficit primário zero.

São três propostas encaminhadas ao Congresso Nacional que, segundo o ministro, não criam receita adicional, mas repõem recursos em renúncia que não estavam previstos no projeto de lei orçamentária enviado pelo governo em 31 de agosto, já aprovado pelo Legislativo.

A MP trata da reoneração gradual da folha de pagamentos, que foi prorrogada pelo Congresso para 17 setores até 2027; prevê a limitação das compensações tributárias decorrentes de decisões judiciais; e trata da retomada da tributação sobre o setor de eventos, beneficiado no início da pandemia com o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).

Com relação à reoneração da folha, a MP prevê um retorno gradual da tributação, com alíquotas diferenciadas setor a setor. A regra prorrogada pelos parlamentares permite às empresas o pagamento de alíquotas de contribuição previdenciária sobre a receita bruta de 1% a 4,5%, conforme o serviço prestado, em vez de 20% sobre a folha salarial.

O texto invalida ainda o abatimento de impostos da folha de salários de funcionários de prefeituras de até 142 mil habitantes e cria um teto para que as empresas que ganharam ações contra o Fisco possam descontar de seus impostos.

A medida, porém, foi recebida com mal estar pelo Congresso Nacional e algumas entidades de classe, que apontaram “insegurança jurídica” e “risco aos empregos”.

O senador Angelo Coronel (PSD-BA), relator do projeto de lei, criticou a iniciativa do governo. “O mais certo era deixar andar a lei como já foi promulgada e, no decorrer do exercício futuro, discutir outra maneira de ajustar via projeto de lei. E não por medida provisória, cujos efeitos são imediatos”, disse. O parlamentar, que integra a base do governo no Senado, acredita que isso pode pode gerar uma crise política para o governo Lula em 2024.

“Isso dá uma fragilizada na relação do Poder Executivo com o Congresso, já que foi um projeto aprovado com ampla maioria na Câmara e no Senado, o governo vetou e o veto foi derrubado também com maioria esmagadora. Aí vem uma medida provisória em cima desse texto? Acho muito perigoso e tende a ferir, a fragilizar a relação do Congresso com o governo”, disse.

Já a deputada federal Any Ortiz (Cidadania-RS), relatora da lei que prorrogou a desoneração da folha de pagamentos, disse que a edição dessa MP “contraria a vontade do Congresso, que representa a totalidade dos brasileiros”, causando uma enorme insegurança jurídica.

“Certamente a iniciativa sofrerá resistência não só dos setores econômicos, mas do Congresso, que se vê desrespeitado diante de uma decisão quase unânime”, disse a deputada, reforçando que a MP “prejudica o ambiente de negócios e causa insegurança aos empregadores.”

Representante da indústria têxtil, a ABIT manifestou preocupação com a reversão gradual da desoneração da folha de pagamentos, que tem o setor entre os 17 beneficiados. A associação diz em nota que reconhece o esforço do governo para atingir a meta de zerar o déficit das contas primárias no ano que vem. Porém, alerta que a reoneração parcial da folha pode afetar parte do 1,5 milhão de postos de trabalho formais mantidos pelo setor.

Também lamentou a ausência, no pacote anunciado por Fernando Haddad, da taxação das compras de até US$ 50 em plataformas internacionais de comércio eletrônico.

“Enquanto o setor produtivo brasileiro sofre com a elevada carga tributária do País, fabricantes e comerciantes estrangeiros valem-se da isenção e, com isto, competem de maneira não isonômica com os agentes econômicos brasileiros”, reclamou a ABIT, colocando-se à disposição ao diálogo com o Ministério da Fazenda e o Congresso, reivindicando uma proposta definitiva sobre tributação da folha salarial na próxima etapa da reforma tributária, que tratará do IR.

COMO FICOU

A proposta do governo com a medida editada hoje é a reoneração parcial, não mais diferenciada por setores, mas sim, por atividade econômica. A MP traz dois anexos com a divisão dos grupos e a forma como será retomada a tributação.

O primeiro grupo inclui as empresas das seguintes atividades: transporte ferroviário de carga; Transporte metroferroviário de passageiros; Transporte rodoviário coletivo de passageiros, com itinerário fixo, municipal e em região metropolitana; Transporte rodoviário coletivo de passageiros, com itinerário fixo, intermunicipal, interestadual e internacional; Transporte rodoviário de táxi; Transporte escolar; Transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, e outros transportes rodoviários não especificados anteriormente; Transporte rodoviário de carga; Transporte dutoviário; Atividades de rádio; Atividades de televisão aberta; Programadoras e atividades relacionadas à televisão por assinatura; Desenvolvimento de programas de computador sob encomenda; Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis; Desenvolvimento e licenciamento de programas de computador não customizáveis; Consultoria em tecnologia da informação; e Suporte técnico, manutenção e outros serviços em tecnologia da informação.

Para esse grupo, a regra prevê que a alíquota da contribuição previdenciária será retomada da seguinte forma: será de 10% em 2024; 12,5% 2025; 15% em 2026; e 17,5% em 2027.

O segundo grupo engloba as seguintes atividades: Curtimento e outras preparações de couro; Fabricação de artigos para viagem, bolsas e semelhantes de qualquer material; Fabricação de artefatos de couro não especificados anteriormente; Fabricação de calçados de couro; Fabricação de tênis de qualquer material; Fabricação de calçados de material sintético; Fabricação de calçados de materiais não especificados anteriormente; Fabricação de partes para calçados, de qualquer material; Construção de rodovias e ferrovias; Construção de obras de arte especiais; Obras de urbanização – ruas, praças e calçadas; Obras para geração e distribuição de energia elétrica e para telecomunicações; Construção de redes de abastecimento de água, coleta de esgoto e construções correlatas; Construção de redes de transportes por dutos, exceto para água e esgoto; Obras portuárias, marítimas e fluviais; Montagem de instalações industriais e de estruturas metálicas; Obras de engenharia civil não especificadas anteriormente; Edição de livros; Edição de jornais; Edição de revistas; Edição integrada à impressão de livros; Edição integrada à impressão de jornais; Edição integrada à impressão de revistas; Edição integrada à impressão de cadastros, listas e de outros produtos gráficos; Atividades de consultoria em gestão empresarial. Para essas atividades, a retomada das alíquotas será feita de acordo com esse cronograma: 15% em 2024; 16,25% em 2025; 16,5% em 2026; e 18,75% em 2027.

Conforme o ministro Haddad anunciou na última quinta, as alíquotas previstas na MP serão aplicadas sobre o salário de contribuição do segurado até o valor de um salário mínimo, aplicando-se as alíquotas padrão sobre o valor que ultrapassar esse limite, de 20%.