Por Lu Aiko Otta
Enquanto o mercado mergulhava no mau humor por causa da piora no cenário externo e do afrouxamento na condução das contas públicas nos próximos anos, no Ministério do Planejamento o clima era de celebração. Não, evidentemente, pela mudança das metas fiscais. Mas pela introdução, no aparato orçamentário, do processo de revisão de gastos.
A estreia se deu no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2025, apresentado ao Congresso Nacional na última segunda-feira.
Emendas individuais não existem em nenhum outro país
“Não é um grande movimento, que vai gerar uma economia trilionária”, disse à coluna o secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas, Sergio Firpo. As revisões de gastos não podem sequer ser encaradas como sinônimo de redução de despesas, pois nem sempre são. “Não resolve o problema do primário, como vários analistas gostariam”, admitiu.
Ou seja, não é por aí que o governo dará uma resposta definitiva à pergunta que não quer calar: onde está o ajuste das contas públicas pelo lado das despesas.
Porém, é o início de algo sempre muito demandado pela sociedade: gastar melhor os recursos públicos.
“É um caminho sem volta”, disse o secretário de Orçamento, Paulo Bijos. Assim como foram incluídas no PLDO, economias com revisões de gastos poderão impactar as estimativas de despesas em outras peças, como o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLDO), a ser encaminhado ao Congresso no dia 31 de agosto, ou os relatórios bimestrais de projeções de receitas e despesas, informou.
O processo é demorado, mas pode impactar os juros sobre a dívida pública, disse Firpo. A revisão de gastos permite que sejam recompostos os orçamentos de políticas públicas mais bem avaliadas e serviços públicos com melhor regulação. Com isso, aumenta a produtividade da economia brasileira e há impacto na capacidade de repagamento da dívida, explicou.
“A revisão periódica de gastos é importante e louvo o início do processo”, comentou o economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto. “Contudo, precisa ser mais abrangente e tem de ser incorporado à parte central do gasto para que possa produzir efeitos mais robustos e duradouros, a meu ver.”
No PLDO 2025, a economia com as revisões de gastos com benefícios previdenciários e Proagro chegará a R$ 37,3 bilhões até 2028. Uma cifra modesta, considerando que a despesa projetada para os benefícios é de R$ 946,46 bilhões só no ano que vem.
Mas, explicou Bijos, essa não é toda a história. Com base nos trabalhos que já ocorrem, seria possível apresentar números mais arrojados. No entanto, optou-se por usar apenas aquelas economias que já estão consolidadas, explicou.
Em seu anexo fiscal, o PLDO aponta para economias maiores no caso do Proagro. Limitações aprovadas na semana passada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) vão permitir uma economia de R$ 8,7 bilhões até 2028. O Banco Central propôs outras duas medidas que, se concretizadas, elevarão essa cifra para R$ 14 bilhões.
Além dos benefícios previdenciários e do Proagro, o governo revisa os gastos do seguro-defeso. Foi identificado que o número de beneficiários é bem superior ao de pescadores cadastrados. Um cruzamento de dados ajudará a eliminar pagamentos feitos de maneira indevida.
O trabalho prosseguirá com outros benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Por exemplo, os benefícios assistenciais.
As revisões estão focadas nos gastos obrigatórios do governo federal, que têm apresentado forte crescimento. Neste ano, representarão 16,86% do Produto Interno Bruto (PIB). No ano que vem, 17,24% do PIB. O objetivo é abrir espaço no Orçamento para as despesas discricionárias do Executivo. Conforme dados do PLDO, elas devem recuar de 2,07% do PIB para 1,72% do PIB no período.
Os próximos passos, segundo o PLDO, incluem revisar gastos tributários e benefícios financeiros e creditícios. Juntos, os três itens consomem perto de 5% do PIB. Além desses, estudos para identificar ineficiências na aplicação de recursos.
Por mais que a revisão de gastos seja ampliada para toda a Esplanada, como pretende o Planejamento, isso não será suficiente para conter o crescimento das despesas obrigatórias. Técnicos reconhecem isso e debatem o problema internamente no governo.
O Tesouro Nacional, por exemplo, fez simulações sobre quanto seria aberto de espaço para despesas discricionárias, caso fossem mudadas as atuais regras de indexação das despesas com saúde e educação (receita corrente líquida e receita líquida de impostos, respectivamente). Se o critério passasse a ser o crescimento populacional, por exemplo, o ganho seria de R$ 23 bilhões em 2026.
O calendário eleitoral e a polarização política impõem cuidado extra em abrir essa discussão, reconhecem. Não se espera que propostas venham a público antes das eleições deste ano.
Assim, é estreito o espaço para reduzir despesas. O afrouxamento das metas fiscais reflete, em certa medida, o reconhecimento desse cenário: com a trilha do ajuste pelo lado das receitas perto do esgotamento, não resta muito a fazer no curto prazo.