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Bancos e corretoras iniciam revisão da Selic e esperam nova alta em setembro
Mercado de trabalho aquecido, expectativas de inflação desancoradas e sinalizações de integrantes do BC fazem mercado prever juros a até 12% neste ano
23/08/20024
CNN Brasil

Ao longo dos últimos dias, o mercado iniciou um movimento de revisão para cima das expectativas dos juros pelo Banco Central (BC), tema que não fazia parte do debate até algumas semanas atrás.

A piora constante das expectativas para a inflação fez com que bancos e corretoras passassem a ver que este movimento se dará já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, entre os dias 17 e 18 de setembro.

A taxa básica de juros está em 10,5% ao ano desde maio, quando o colegiado cortou a taxa em 0,25 ponto percentual. Na última reunião do Copom, em julho, analistas viram tom mais duro da cúpula do BC.

O sinal ficou mais forte nas últimas semanas, com falas seguidas de autoridades do BC afirmando que alta dos juros não está descartada pelo BC caso o cenário exija, apesar de não citarem prazos.

Analistas e instituições consultadas pela CNN apontam para a direção de política mais restritiva nos próximos encontros do Copom, apesar de pequenas diferenças de até que patamar o BC está disposta a subir os juros neste novo ciclo de alta.

Economia aquecida e expectativas desancoradas

Para Tony Volton, ex-diretor do BC e professor adjunto da Universidade de Georgetown, o cenário abre espaço para três altas seguidas de 0,5 ponto a partir do próximo mês, encerrando o novo ciclo de avanço com juros em 12%.

O economista pontua que o aquecimento da economia doméstica, refletido sobretudo no aumento das expectativas para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano e baixa taxa de desemprego, mostra que a demanda está acima da oferta, o que gera mais pressão para trazer a inflação para a meta de 3%.

Além disso, o ex-BC cita a política fiscal expansiva e a desancoragem para as expectativas da inflação em todos os prazos.

A autoridade monetária persegue meta de inflação de 3% — com margem de 1,5 ponto para cima ou para baixo.

Para o mercado, o número não será entregue neste ano, nem no próximo, segundo Boletim Focus. Para 2024, analistas enxergam o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 4,22%, enquanto para o ano que vem a perspectiva é de 3,91%.

No último dado divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os preços ao consumidor subiram 0,38% em julho e acumulam alta de 4,5% nos últimos 12 meses.

“Quando olhamos um checklist de fatores que impactam na dinâmica da inflação, o argumento é que sim, o Banco Central deveria iniciar um pequeno ciclo de alta dos juros”, diz.

A XP passou a ver a Selic a 11,75% ao final deste ano, prevendo um aumento de 0,25 ponto percentual no próximo mês, seguido de duas altas de 0,5 ponto em novembro e dezembro e uma final de 0,25 ponto em janeiro do ano que vem, levando o juro para 12%.

Em relatório, a consultoria cita o mercado de trabalho aquecido, a recente depreciação da taxa de câmbio brasileira frente a seus pares e as expectativas de inflação, que seguem subindo.

O diagnóstico é o mesmo feito pelo BTG Pactual, pela Legacy Capital, pelo Asa Investments e pela ARX Investimentos, que também revisaram as projeções. No caso do BTG, o banco menciona que um ajuste monetário “está se tornando cada vez mais necessário”.

A Legacy enxerga uma postura ainda mais agressiva do BC e prevê uma Selic a 12% ainda em 2024. Com cerca de R$ 19 bilhões sob gestão, a Legacy trabalha com a possibilidade de três altas de 0,50 ponto já a partir de setembro.

A leitura é a mesma da ARX, porém, com uma intensidade menor. A gestora avalia que um novo aumento virá no próximo mês, elevando a taxa para 11%, patamar que deve permanecer até o fim do ano.

A percepção de juros mais altos no ano que vem já se mostra consolidada dentro do mercado financeiro, que agora descarta uma Selic a um dígito em 2025. A maioria dos agentes prevê os juros a 10%, de acordo com a última pesquisa Focus.

Fator Galípolo

Apesar das incertezas com o horizonte inflacionário, a XP menciona que as recentes sifnalizações de membros do Banco Central foram o gatilho para a mudança de expectativa sobre os juros.

Nas últimas semanas, a postura mais dura da autarquia tem sido liderada pelo diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo. Além de indicar um cenário mais desconfortável para o BC com as recentes projeções altistas do mercado para os preços, Galípolo tem reiterado que a instituição não hesitará em subir os juros, caso seja necessário.

“Eles [os membros do Copom] mencionaram que as perspectivas de inflação são desconfortáveis e assimétricas para cima, e que o aumento das expectativas inflacionárias exige uma reação”, cita a XP em seu comunicado.

O diretor de macroeconomia do ASA e ex-diretor de política econômica do BC, Fábio Kanczuk, avalia que a inflação deve continuar subindo, ainda que de maneira suave, nos próximos meses e se diz cético ao comentar a capacidade da autoridade monetária de atingir a meta de inflação.

Essa alta de juros, esse ciclo pequeno em torno de 150 pontos, não é suficiente para fazer a inflação ir para a meta. Não me convenci de que o Banco Central do Galípolo tem disposição para buscar a meta. Eu ainda não acredito

Fábio Kanczuk, diretor de macroeconomia do ASA

Na avaliação dele, com o Banco Central subindo os juros ainda em 2024, o governo estaria em uma zona de conforto, pois poderá seguir direcionando críticas ao atual presidente da instituição, Roberto Campos Neto, indicado pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Para Volpon, a alta dos juros nos próximos meses pode ser uma forma de Galípolo mostrar ao mercado de que não haverá mudanças na atual condução do BC em não ser leniente com a inflação.

“Seria uma indicação por parte dele que tem compromisso com a meta, até antes de ser nomeado”, explica o ex-diretor do BC.