Por Lu Aiko Otta
Dada na esteira da divulgação de pesquisas de opinião que apontam para a piora na avaliação do governo, a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que os bons resultados na arrecadação permitem ampliar despesas gerou intepretações diferentes dentro da equipe econômica.
“Fala política”, afirmou um integrante, acrescentando que o Congresso Nacional não concordaria em rever o limite de despesas estabelecido no arcabouço, por conhecer os custos políticos de tal decisão.
Outra fonte, porém, entendeu que Lula se referia a um dispositivo presente na própria lei do arcabouço fiscal, que permite elevar as despesas por crédito suplementar caso as receitas estejam com performance acima do esperado. Nesse caso, a expansão poderia chegar a R$ 12 bilhões, informou.
Ambos, porém, coincidiram em afirmar que, embora as receitas estejam vindo fortes, é cedo para tomar qualquer decisão. A meta de zerar o déficit público em 2024 segue como um grande desafio e um contingenciamento nas despesas em março não está descartado.
“Vocês estão percebendo que a arrecadação está aumentando além daquilo que muita gente esperava. Lógico que nós temos um limite de gastos, que quando a gente tiver mais dinheiro a gente vai ter que discutir com a Câmara e o Senado esse limite de gastos e vamos ver como é que a gente pode utilizar mais dinheiro para fazer mais benefício para o povo. O que é importante vocês terem clareza que ninguém ficará de fora”, afirmou o presidente nesta quinta-feira, em evento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
O novo arcabouço fiscal estabelece um limite máximo para as despesas. Neste ano, são R$ 2,1 trilhões. O valor corresponde aos gastos de 2023, acrescidos de 70% do aumento da receita observada no ano passado. Em tese, uma arrecadação robusta como a vista em janeiro e fevereiro não altera esse limite.
No entanto, apenas para este ano, a lei do arcabouço estabelece que o limite de despesas poderá ser ampliado por crédito suplementar, após a segunda avaliação bimestral de receitas e despesas primárias, divulgada no final de maio, se as receitas estiverem com boa performance.
É, porém, um cenário ainda distante. “Ainda é muito cedo”, disse a fonte. “É muito bom termos bons resultados nas receitas no início do ano, mas ainda há muitos desafios, estamos ainda longe de um cenário confortável.”
Um técnico comentou que existe uma questão anterior a se discutir o uso desse dispositivo. “A arrecadação tem que ser suficiente para evitar contingenciamento, primeiro.”
A arrecadação federal foi recorde histórico em janeiro e, conforme dados preliminares obtidos pelo Valor, seguiram fortes em fevereiro, com crescimento nominal de cerca de 20% nas receitas administradas líquidas (impostos e contribuições controlados pela Receita, descontadas as deduções). O dado, que ainda não é o oficial, indica que as medidas propostas pelo Ministério da Fazenda para elevar a arrecadação estão dando o resultado esperado.
No próximo dia 22, o governo divulgará novas projeções de receitas e despesas este ano, e as comparará com a meta de zerar o déficit. Dessa forma, vai determinar se será ou não necessário contingenciar despesas para alcançar o objetivo. Essa avaliação é feita bimestralmente.
Especialistas apostam em algum contingenciamento em março. Embora as receitas administradas estejam praticamente em linha com as projeções no orçamento, é possível que as despesas tenham de ser revistas para cima. Há, por exemplo, subestimativa das despesas com Previdência Social.
Além disso, a arrecadação não administrada pela Receita ficou abaixo do esperado, informou o economista-chefe da AZ Quest, Alexandre Manoel. Ele estima, por isso, que em março será anunciado contingenciamento de R$ 23 bilhões.