Por Marta Watanabe
De forma que surpreendeu tributaristas e economistas, o governo optou por estabelecer a tributação complementar sobre multis que atuam no Brasil via Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e não via Imposto de Renda (IR). Com isso, a União garante que essa receita não será dividida com Estados e municípios.
Grande parte do esforço fiscal do governo para garantir novas receitas está centrado no IR, que tem um quarto de sua arrecadação dividida os demais entes federados. O governo estima que a nova cobrança pode gerar arrecadação adicional de R$ 8 bilhões anuais a partir de 2027, segundo fonte próxima à Receita Federal.
A entrada de receitas vem a partir de 2026, mas a “velocidade de cruzeiro” vem somente no ano seguinte, segundo a mesma fonte.
A opção pela CSLL também explica a veiculação da MP 1.262/24 em edição extra do “Diário Oficial” com data de ontem, para garantir a anterioridade de 90 dias exigida para a contribuição entrar em 2025 já estabelecida.
Mas não é só a escolha pela CSLL que difere a nova tributação. Num cenário de esforço para cumprir a meta de resultado primário via receitas em um país em que a carga tributária é relativamente alta, toda nova tributação é recebida com desconfiança e críticas. O adicional de CSLL estabelecido pela MP é, na verdade, uma medida para viabilizar tributação estabelecida em acordo conduzido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Integrado por mais de 140 países, o acordo prevê em seu chamado pilar 2 – ou no Global Anti-Base Erosion (GloBE) – a tributação corporativa mínima sobre lucro de 15% para multinacionais com faturamento superior a 750 milhões de euros anuais.
A tributação nominal no Brasil sobre lucro das empresas soma 34%, considerando 25% de Imposto de Renda e 9% de CSLL. Por meio de incentivos fiscais ou deduções na base de cálculo dos dois tributos, porém, a carga efetiva pode ficar abaixo dos 15%. O adicional de CSLL será pago sobre o lucro das operações das empresas que ficam com a carga abaixo dos 15%.
O adicional de CSLL, na verdade, é o chamado QDMTT, na sigla em inglês para o Imposto Complementar Mínimo Doméstico Qualificado. A cobrança é considerada uma espécie de mecanismo de defesa para os países que são anfitriões das subsidiárias de grandes grupos com matrizes no exterior. Isso porque, caso o país anfitrião não cobre a diferença para a tributação mínima de 15%, a receita tributária poderá ser auferida pelo país em que está a matriz da companhia. Ou seja, se o governo brasileiro não cobrar esse tributo complementar, ele poderá ser exigido em outro país.
Nem por isso a nova tributação estará livre de questionamentos. Tributaristas que já se debruçaram sobre a MP e a instrução normativa publicadas informam que há conceitos importantes do GloBE que foram incorporados via instrução normativa e não pela MP, o que pode suscitar questionamentos jurídicos baseados no princípio da legalidade.