Por Alex Ribeiro
Dois documentos divulgados pelo Banco Central mostram que as projeções de inflação dos analistas econômicos coletadas no boletim Focus mexem com os preços no mercado financeiro e ajudam a formar as expectativas das empresas.
São novas evidências que contrariam a tese de que as expectativas de inflação do mercado estão descoladas da realidade econômica e que, portanto, não deveriam ter tanto peso no processo decisório do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central.
Um texto para a discussão de autoria de dois economistas do próprio Banco Central e da EPGE/FGV mostra que o boletim Focus, divulgado nas manhãs de segundas-feiras, tem efeitos significativos nos preços de ativos negociados em mercado.
Um outro documento, a pesquisa Firmus, que coleta as expectativas das empresas para a inflação e outras variáveis econômicas, revela que elas usam o boletim Focus e informações coletadas diretamente junto a analistas econômicos do mercado para formar a sua própria opinião sobre os preços na economia.
As expectativas coletadas no Focus alimentam os próprios modelos de projeção de inflação do Banco Central, que são um dos pontos de partida para as decisões de juros do Copom. Na prática, expectativas desancoradas tendem a levar a uma taxa de juros mais alta. Atualmente, as expectativas de inflação estão acima da meta, de 3%, durante todo o mandato do futuro presidente do BC, Gabriel Galípolo, que vai até 2028.
Um trabalho para discussão dos economistas Gustavo Silva Araujo e Giancarlo Noel Caoduro mostra que três variáveis do Focus – projeções de inflação, para o PIB e para a própria Selic – têm efeitos na curva de juros futuros de curto prazo no dia em que são divulgadas. Entre as variáveis investigadas, as únicas que não tem impacto são as expectativas para a taxa de câmbio.
O resultado é um pouco surpreendente. Às segundas-feiras, o Banco Central divulga as expectativas coletadas junto ao próprio mercado nas sextas-feiras anteriores. Teoricamente, já deveriam ser conhecidas e, de alguma forma, estarem incorporadas nos preços. O trabalho para discussão mostra que, na verdade, o boletim Focus representa uma informação nova para os participantes do mercados.
O trabalho acadêmico (“Impacto da Divulgação de Pesquisas de Expectativas de Variáveis Macroeconômicas na Taxa de Juros Brasileira”, disponível no site do BC) mostra que estão certos os relatos sobre o dia do mercado feito pelos jornais, que com frequência dizem que a curva de juros mexeu em virtude da divulgação de dados novos pelo boletim Focus.
Ainda falta uma discussão mais profunda sobre se a mexida nos juros futuros tem a ver com a revelação de um cenário inflacionário até então desconhecido pelo mercado financeiro ou se, simplesmente, os preços dos ativos mexem porque os operadores têm conhecimento que o Copom leva em conta as expectativas dos Focus nas suas decisões sobre a taxa básica de juros.
Já o boletim Firmus, uma outra pesquisa divulgada ontem, mostra que 82,1% das empresas consultadas se informam no boletim Focus para formar a sua expectativa de inflação.
Os dados revelam que as empresas têm uma expectativa de inflação um pouco maior do que o Focus. Quando os dados foram coletados, em agosto, as empresas previam uma inflação de 4% para 2025, enquanto que o Focus na época apontava uma variação dos preços de cerca de 3,95%.
A influência do mercado financeiro sobre as empresas ocorre em diversas camadas. Segundo a Firmus, 81,1% das empresas ouvem consultorias e instituições financeiras para formar sua opinião, e 72,6% ouvem o mercado financeiro. Segundo a pesquisa, 77,9% das empresas dizem que também utilizam as suas informações próprias para estimar a inflação futura.
O Banco Central também tem alguma influência nas expectativas das empresas, já que 66,3% dizem que prestam atenção no que diz a autoridade monetária para tirar a sua própria conclusão sobre a taxa de inflação. Isso, em tese, abre um caminho para o Banco Central procurar influenciar diretamente as expectativas das empresas, e também reforça a importância de ouvi-las diretamente para entender a dinâmica do processo inflacionário.