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Impactos das decisões da COP28 no setor privado brasileiro
Neste artigo, Maria Christina Motta Gueorguiev e Juliana Coelho Marcussi , do Veirano Advogados, falam sobre a transição energética de combustíveis fósseis para sistemas de energia limpa
27/12/2023
Valor Econômico

Por Maria Christina Motta Gueorguiev e Juliana Coelho Marcussi

 

A mais esperada decisão da COP28 consistiu nos resultados do chamado Balanço Global (ou Global Stocktake), cuja versão final foi publicada no dia 13 de dezembro de 2023. Trata-se da primeira publicação das avaliações sobre o progresso coletivo dos países-membros na implementação do Acordo de Paris para cumprimento das metas estabelecidas.

Enquanto alguns veem a decisão como um avanço histórico no escopo da ação climática, outros consideram o seu conteúdo generalista e singelo, pecando pela ausência de conclusões e recomendações mais assertivas. De toda forma, independente da visão adotada, o Balanço Global consiste no primeiro documento formal emitido sob a UNFCCC em que o tema combustíveis fósseis é expressamente tratado.

No documento, os países reconhecem os avanços na implementação do Acordo de Paris, porém indicam que o ritmo da execução das medidas para o cumprimento das metas assumidas está aquém do estimado. Frente a isso, as partes também reconhecem que, para que se limite o aquecimento global a 1.5°C, são necessárias reduções profundas, rápidas e sustentadas das emissões globais em 43% até 2030 e 60% até 2035 em relação aos níveis de 2019, alcançando emissões líquidas zero de dióxido de carbono até 2050.

Para essa consecução, destaca-se, dentre as conclusões da decisão, o pacote de transição energética acordado, que inclui, dentre outras medidas, a triplicação da capacidade global de energia renovável e duplicação da média anual global de eficiência energética até 2030, a diminuição (phase down) do uso de carvão cujas emissões resultantes da produção não chegaram a ser mitigadas (unabated), e a transição oposta (trasitioning away) ao uso de combustíveis fósseis em sistemas de energia, visando a atingir a neutralidade de emissões até 2050, de forma justa, ordenada e equitativa.

Diante das deliberações alcançadas, vale ponderar que, por mais que o texto acordado seja genérico, sem metas mais específicas a curto prazo, a decisão foi publicada em um contexto de preparação das novas NDCs dos países, que deverão ser apresentadas pelas partes em 2025, ano da COP30 a ser realizada no Brasil. Ao assumir tais compromissos, os países deverão fazer as devidas adequações às suas políticas públicas e sistemas de governança climáticos, caso ainda não estejam desenhados de forma a viabilizar o alcance das metas assumidas.

No que diz respeito às expectativas sobre o Brasil, as decisões do Balanço Global poderão induzir a criação de novas obrigações legais de descarbonização ao setor privado como, por exemplo, a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa. Além disso, os setores intensivos em carbono serão direcionados a providenciar os aprimoramentos em suas operações, visando ao caminho da descarbonização.

Por outro lado, considerando a vantagem competitiva do país a partir da sua matriz energética baseada em fontes renováveis, são promissoras ao setor privado as oportunidades de investimento em projetos de energia limpa. A esse respeito, não somente o governo brasileiro se posicionou nesse sentido, o que tem sido constatado em iniciativas já em execução, como também instituições financeiras que têm trabalho no mapeamento das oportunidades de financiamento de produção, infraestrutura e disponibilidade da matriz energética limpa. Durante a COP28, foi reconhecida e enfatizada a importância do conteúdo local e da flexibilidade das soluções, como, por exemplo, o uso dos biocombustíveis no Brasil, e combustíveis de transição por países altamente dependentes de carvão.

Inclusive, maior atenção também tem sido dada – e certamente receberá um incentivo ainda maior a partir das decisões da COP28 – ao desenvolvimento de tecnologias aplicadas à agropecuária e atividades de uso do solo no Brasil, com vistas à mensuração das mitigações de emissões, bem como gerar oportunidades com a implementação de novas metodologias e alternativas de descarbonização do setor, focado não somente na produção de alimentos como também de insumos para biocombustíveis.

A COP 28 teve um dia dedicado à agricultura e segurança alimentar, com destaque pelo Brasil, às práticas regenerativas agropecuárias e agroflorestais. Discussões sobre escala dos projetos, redesenho de critérios e indicadores de risco-retorno, assim como a precificação dos custos dos projetos foram temas tratados em Dubai, com forte participação do governo, desenvolvedores e investidores.

Espera-se uma crescente no desenvolvimento de tecnologias e metodologias para mensuração de redução de emissões, bem como para o mapeamento de oportunidade e alocação de riscos em investimentos sustentáveis e de baixo carbono. Instituições financeiras adotarão um novo padrão específico para tais fins, de forma a trazer mais segurança aos investimentos e, por consequência, maiores chances de viabilização para a descarbonização da economia real.

Quanto a isso, o governo brasileiro já manifestou que os resultados da COP28 direcionarão os trabalhos do Plano Clima, atualmente em elaboração. Por fim, importante ressaltar o protagonismo do Brasil na promoção da ação climática, dado que, como próximos passos, as partes decidiram lançar, sob a orientação das Presidências das COPs 28, 29 e 30, Emirados Árabes Unidos, Azerbaijão e Brasil, respectivamente, um conjunto de atividades para aprimorar significativamente a cooperação internacional e o ambiente internacional propício, buscando estimular a ambição na próxima rodada de NDCs, com o objetivo de fortalecer ação climática para manter o aumento da temperatura global a 1.5 °C, com base na Missão 1.5 apresentada pelo Brasil durante a COP28.