Por Alex Ribeiro
Os analistas econômicos do mercado financeiro receberam com mau humor a alta da nota de risco soberano do Brasil pela Moody’s. Mas, embora os riscos fiscais tenham sido subestimados, a agência levantou um ponto que merece ser debatido: o país pode crescer mais sem causar desequilíbrios?
A Moody’s reviu a sua estimativa para o chamado Produto Interno Bruto (PIB) potencial de 2% para 2,5%, em decorrência das reformas econômicas que foram feitas desde o governo Michel Temer.
Eles não estão sozinhos nessa avaliação. O Fundo Monetário Internacional (FMI) chegou à mesma conclusão no seu relatório anual de avaliação sobre a economia brasileira, divulgado em julho.
O argumento já estava presente entre nossos economistas. Dirigentes do Banco Central vêm afirmando, já faz algum tempo, que essa velocidade de cruzeiro pode ter se acelerado, embora oficialmente não tenham divulgado nenhuma estimativa. Na entrevista do Relatório de Inflação de setembro, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, deu a entender que enxerga uma capacidade de crescimento entre 2% e 2,5%.
A tese é compartilhada pelo economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita, que foi diretor de Política Econômica do Banco Central. Mas ele tem pregado certa prudência, já que essas medidas são muito incertas.
O mercado financeiro parece mais cético. Até 2019, o boletim Focus estimava a capacidade de crescimento em 2,5%. Com a pandemia, foi revista para baixo, para 2%.
Numa pesquisa que o Comitê de Política Monetária (Copom) fez antes de sua reunião de junho, o cenário era desolador. Os analistas do mercado disseram que a capacidade de crescimento não inflacionário deverá ficar estagnada em 2% no horizonte de cinco anos.
Há três anos a economia cresce acima do esperado pelos economistas. Uma parte disso se deve simplesmente à política fiscal expansionista desde as eleições de 2022, quando o governo Jair Bolsonaro acelerou os gastos públicos.
Mas o que intriga é que a aceleração do crescimento econômico foi acompanhada de queda na inflação. Pode ser que, daqui para diante, o impulso fiscal tenha algum efeito inflacionário, já que ele opera com defasagens. Mas é bom lembrar que o mercado financeiro vem repetindo há dois anos, no questionário pré-Copom, que a economia opera no limite ou acima da capacidade. Se fosse assim, a inflação de serviços sensíveis ao ciclo econômico não deveria ter caído da forma como caiu.
Em setembro, o Banco Central reviu todo o seu diagnóstico sobre a ociosidade da economia. Agora, indica que estava no limite ou acima da capacidade nos dois últimos anos. Mas isso se deve a uma mudança de metodologia. Agora, dá um grande peso aos modelos que olham a tendência estatística ou tentam inferir a capacidade ociosa a partir de fatores como capital, trabalho e produtividade. Eles dizem que não há ociosidade. Mas o modelo semiestrutural que até então era usado no Relatório de Inflação – que inclui a própria inflação nos cálculos – dizia haver ociosidade até outro dia.
Um bom pedaço desse desempenho se deve ao efeito das reformas econômicas feitas desde o governo Temer. O FMI divulga, no seu relatório, um box que tenta medir o efeito da reforma trabalhista. Houve reforma importantes no governo Bolsonaro, como a reforma da Previdência e a independência do BC, mas retrocessos nos quesitos ambiental e democracia afastaram investidores.
No começo do governo Lula, a estimativa do mercado sobre o PIB potencial chegou a cair. Dos 2% estimados ao fim da pandemia, foi para 1,8%. Na época, a visão corrente do mercado era que o ajuste fiscal feito pelo governo Lula iria aumentar a carga tributária e isso iria reduzir os investimentos produtivos. Depois , como a economia vinha bem, a estimativa subiu a 2%.
A reforma tributária, aprovada no governo Lula, pode ajudar aumentar o PIB potencial. Mas o mercado parece subestimar esse efeito. Em junho do ano passado, seis meses antes da promulgação da reforma tributária, sua estimativa era que o PIB potencial ficaria em 1,9% dentro de cinco anos. Depois da aprovação, oscilou para 2%.
Ainda que a capacidade de crescimento da economia seja maior, como diz a Moody’s, isso não resolve os problemas fiscais. Existe uma regra de bolso – muito grosseira, mas ainda assim útil para a compreensão mais geral do problema – que diz que a dívida de um governo se estabiliza se o crescimento da economia se iguala r à taxa de juros real.
Hoje, a visão mais otimista sobre o juro de longo prazo é do BC, com 4,75%. Um crescimento do PIB de 2,5%, em vez de 2%, ajuda um pouco, mas não resolve todo o problema. Para suprir essa diferença, o governo precisa de um superávit primário, que por essa conta dá 2,25% do PIB.
Os economistas, de forma geral, não acreditam que o governo vai atingir esse objetivo nos próximos anos. Sem reformas fiscais estruturais, as despesas obrigatórias vão tornar inexequível o arcabouço fiscal. A Moody’s tem o mesmo diagnóstico, mas a perspectiva positiva que colocou para a nota brasileira sinaliza sua confiança de que o problema será resolvido.