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Finanças Públicas
O penoso trabalho de cortar despesas
Economia com pente-fino em benefícios sociais deve ficar abaixo do que governo esperava
23/04/2025
Valor Econômico

Por Lu Aiko Otta
Deverá ficar aquém do esperado o pente-fino em benefícios sociais, com o qual se pretendia economizar R$ 25,9 bilhões neste ano. O governo cortou em 65% a estimativa de redução em despesas no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), de R$ 7,2 bilhões para R$ 2,5 bilhões. Também está abaixo do esperado a cessação de Benefícios de Prestação Continuada (BPC) pagos irregularmente.
Os dados foram divulgados na semana passada, quando foi enviado ao Congresso Nacional o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026. Demonstra a dificuldade do governo em reduzir despesas, mesmo quando se trata de cortar despesas indevidas.
Um dos anexos do PLDO, o de metas fiscais, justifica a frustração com o INSS. Explica que a implementação do Atestmed, que permite a concessão de benefícios por incapacidade temporária a partir de análise documental, atrasou. Com isso, foi adiada também parte da economia que se pretendia obter ao pagar mais rapidamente aos que têm direito ao benefício, evitando o acúmulo de parcelas atrasadas.
No mesmo documento, o Ministério da Previdência alega que, para atingir os objetivos da revisão, seriam necessários “investimentos em solução sistêmica e tecnológica fornecida pela Dataprev ” e “ampliação da capacidade operacional do INSS mediante o aumento do quadro de pessoal”, o que não ocorreu “conforme inicialmente previsto”.
O uso do Atestmed proporcionará R$ 2,4 bilhões em economia este ano, ante R$ 6,2 bilhões previstos anteriormente. Com combate a fraudes, o ministério espera economizar R$ 100 milhões (eram R$ 900 milhões). Com cobrança de benefícios pagos irregularmente, zero (eram R$ 150 milhões).
Na conta dos R$ 25,9 bilhões do pente-fino, havia economia de R$ 6,4 bilhões com o BPC. No entanto, o PLDO 2026 fala em R$ 2,7 bilhões.
Questionado, o Ministério do Planejamento explica que a cifra maior se refere a um conjunto mais amplo de iniciativas para redução de despesas do programa. O valor menor diz respeito apenas à revisão bienal, na qual será analisado se o beneficiário se enquadra nos critérios do programa. Por exemplo, a renda familiar per capita não pode ser maior do que um quarto de salário mínimo.
No ano passado, informa a pasta, acreditava-se que seria possível parar de forma definitiva o pagamento de 19,65% dos benefícios do BPC. “Entretanto, as ações de revisão cadastral e de superação da renda resultaram em um percentual menor de cessação do que os anteriormente previstos”, diz. “Com isso, o percentual médio de benefícios cessados apresentado pelo órgão foi alterado para 9,48%.”
Apesar dos resultados até agora modestos, a revisão de gastos é apontada pelo governo como uma das ferramentas cujo uso deve ser intensificado para alcançar as metas fiscais ambiciosas propostas no PLDO 2026: superávits de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026, de 0,5% do PIB em 2027, de 1% do PIB em 2028 e de 1,25% do PIB em 2029. A outra aposta é elevar as receitas sem recorrer a aumento de impostos, e sim cobrando com mais efetividade o que é devido pelos contribuintes.
É pouco, diante do que está colocado no horizonte. Os números do PLDO dão carne e osso ao que disse em março a ministra do Planejamento, Simone Tebet: sem medidas adicionais, será impossível ao próximo presidente governar com o atual arcabouço fiscal.
O que determina a inviabilidade é a conta de precatórios a serem pagos pela União. Hoje, parte dela fica fora das regras fiscais. Isso, porém, só vale até o fim de 2026.
A partir de 2027, se os precatórios forem integralmente contados como despesa primária, o quadro é de paralisia da máquina pública. Não haverá dinheiro para cumprir os gastos mínimos que a Constituição estabelece para as áreas de saúde e educação. A insuficiência é calculada em R$ 10,9 bilhões. O quadro se agrava nos anos seguintes.
Olhando mais à frente, em 2029 faltarão R$ 52,8 bilhões para pagar a conta de emendas parlamentares ao Orçamento, projetada em R$ 61,7 bilhões.
São situações insustentáveis, mostram os números. Integrantes da equipe econômica não descartam a alternativa de pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) mais tempo antes de incluir totalmente os precatórios nas regras fiscais.
Alternativas técnicas foram discutidas no final de 2023. Na época, a Fazenda propôs separar a despesa de precatórios em duas: uma parte principal, que passaria a ser contada como despesa primária, e a parte financeira, que por sua natureza ficaria fora das regras fiscais. A ideia não teve apoio do Planejamento, que defendia contabilizar toda a conta no resultado primário, mas fora do limite de despesas do arcabouço. Do ex-secretário do Tesouro Jeferson Bittencourt veio ainda outra sugestão: ajustar o limite de despesa do arcabouço para acomodar os precatórios sem levar o orçamento ao colapso.
Outra forma de dar fôlego ao Orçamento seria reduzir o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias. Esse foi o debate do fim do ano passado que, como se viu, produziu medidas aquém do necessário. Como mostramos nesse espaço, a equipe econômica não vê, no momento, condições políticas para retomar essas discussões.

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