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Reforma Tributária
Reforma tributária: municípios travam batalha em torno do comitê gestor do IBS
São 27 vagas para cerca de 5,7 mil cidades e não há acordo quanto aos critérios para a eleição dos membros
02/05/2024
Valoer Econômico

Por Lu Aiko Otta

 

Nos bastidores, grandes e pequenos municípios travam uma batalha em torno da participação no Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), criado na reforma tributária. São 27 vagas para cerca de 5,7 mil cidades e não há acordo quanto aos critérios para a eleição dos membros.

Esse é um dos pontos de entrave na elaboração do projeto de lei complementar que tratará do Comitê Gestor. A proposta deveria ter seguido para o Congresso Nacional na semana passada, junto com o projeto de lei complementar que detalha o funcionamento do novo sistema tributário.

No entanto, dizem participantes das discussões, não houve tempo para dirimir todas as dúvidas. A meta é concluir a proposta até meados deste mês. As reuniões com o governo federal foram retomadas esta semana.

Há outros pontos pendentes que não puderam ser discutidos a tempo. Por exemplo, como será feita a fiscalização dos novos tributos.

A reforma tributária cria dois impostos idênticos, explicou o presidente da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf), Rodrigo Fantinel. A Contribuição de Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência conjunta de Estados e municípios. “Não faz sentido um fiscal da Receita Federal ir a uma empresa e fiscalizar só a CBS”, exemplificou. Caberá ao Comitê Gestor organizar essa atuação.

Outra questão pendente diz respeito ao orçamento do Comitê Gestor, que será formado por uma parte da arrecadação dos novos tributos. Estados e municípios querem autonomia para geri-lo e afirmam que não aceitarão ingerência.

Como Estados e municípios terão responsabilidade compartilhada sobre um único tributo, o IBS, as decisões serão tomadas no Comitê Gestor. A Emenda Constitucional 132, que estabelece a reforma tributária sobre o consumo, diz que o colegiado será composto por 27 representantes dos Estados e 27 dos municípios. Desses, 14 serão escolhidos numa eleição em que o voto de cada município será considerado independentemente de seu porte.

As outras 13 vagas serão decididas pelos votos de cada município “ponderados pelas respectivas populações”. É esse ponto que causa controvérsia nos bastidores.

Tida como representante das grandes cidades, a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) defende um modelo diferente. Propõe que os 27 votos sejam distribuídos em nove faixas de municípios agrupados conforme a população. A proposta, porém, não tem apoio.

“Vale o que está na Constituição”, disse o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CMN), Paulo Ziulkoski. “Não existe para nós pequeno ou grande.”

A CNM é vista, de forma simplificada, como representante dos pequenos municípios. A entidade, informa Ziulkoski, tem 5.250 municípios filiados, entre eles 22 capitais.

Gilberto Perre, secretário-executivo da FNP, disse que a Constituição estabelece critérios claros para as decisões dos Estados no âmbito do Comitê Gestor (uma combinação entre número de votos e peso populacional), mas não dos municípios.

Vale o que está na Constituição. Não existe para nós pequeno ou grande”

— Paulo Ziulkoski

Fantinel observou que é necessário ter cautela para escolher, para compor o Comitê Gestor, pessoas que tenham conhecimento na administração tributária. Atualmente, alguns municípios não arrecadam o Imposto sobre Serviços (ISS), que na reforma foi fundido com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para formar o IBS.

Ziulkoski, por sua vez, lembrou que algumas grandes cidades se posicionaram contra a reforma tributária no ano passado. A CMN, disse, sempre apoiou a proposta. “O Brasil está mudando”, afirmou.

Estudos apontam que a tributação no destino, instituída pela reforma tributária, desconcentrará as receitas entre municípios.

Quando a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45 foi debatida, no ano passado, a FNP apoiou uma proposta alternativa, a PEC 46, que mantinha a existência do ISS. Essa proposta, porém, não foi aprovada.

Apesar das discordâncias, é comum entre os participantes a avaliação que será possível amarrar um projeto de lei complementar até meados do mês. Quanto maior o grau de consenso, mais fácil será a tramitação da matéria no Congresso Nacional, avaliam.

“A guerra é lá no Congresso”, disse Ziulkoski. “Isso [o projeto de lei complementar] é só o chute inicial, muita coisa vai mudar.”

Para Perre, o fato de ocorrerem este ano as eleições municipais não deverá interferir nas discussões no Legislativo. “São regras permanentes”, comentou.

Diferentemente do que ocorreu em outras tentativas de aprovar uma reforma tributária, as discordâncias no campo federativo não deverão emperrar os debates no Congresso, avaliou Fantinel.

Ele destacou que o Ministério da Fazenda foi capaz de colocar na mesma sala representantes da União, Estados e municípios, num processo conjunto de construção da regulamentação da reforma tributária: “Há muito mais concordâncias do que discordâncias.”