Assis Moreira
A transição verde afetará o crescimento econômico global e causará uma perda acumulada de 6% no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil de agora até 2050, ano em que o país espera alcançar emissões líquidas zero de gases de efeito estufa.
Ao mesmo tempo, sem reformas estruturais o Brasil terá uma convergência mais modesta para os padrões de vida dos Estados Unidos do que países como China, India e Indonésia. Nesse caso, o padrão de vida do brasileiro dentro de 40 anos representará apenas um terço daquele dos EUA.
A conclusão é da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Economico (OCDE) em estudo que atualiza cenários de longo prazo, como faz a cada dois ou três anos, para quantificar tendencias e desafios macroeconômicos importantes aos quais a economia mundial é confrontada.
Pela primeira vez, esse exercício integra o efeito da transição energética de baixo carbono. Sua publicação coincide com aprovação, ontem, por mais de 190 países na COP27 de um acordo que sinaliza para o começo do fim dos combustíveis fósseis (petróleo, carvão, petróleo e gás natural) na luta contra o aquecimento global.
A conclusão do estudo vai na direção de que essa transição afetará o crescimento global. ‘Sim, afetará o crescimento, a mitigação não é isenta de custos’, disse à coluna Yvan Guillemette, um dos autores do documento.
No entanto, disse ele, ‘uma ressalva importante é que não estamos levando em conta os benefícios para o crescimento de evitar danos ambientais, que poderiam ser muito maiores, embora em um horizonte de tempo mais longo. Nosso objetivo é incorporar os danos em uma versão futura desses cenários, para que possamos ter os dois lados da moeda. Um cenário de transição envolveria alguns custos de mitigação, mas também significaria evitar danos ambientais que reduziriam o crescimento e, potencialmente, o paralisariam. Isso deixaria mais claro que vale a pena fazer a mitigação’.
A OCDE apresenta uma projeção de base que age como um cenário de status quo para avaliar efeitos econômicos da transição verde. Em seguida, mostra um relatório alternativo nos quais os países da OCDE e do G20 não-membros da OCDE são bem-sucedidos na transição para uma energia com fraca emissão de carbono e compatível com o objetivo de emissões líquidas zero de gases de efeito serra até 2050.
No cenário de base, a tendência de crescimento anual do PIB real para países da OCDE+G20 diminui gradualmente de cerca de 3% antes da covid-19 para 1,7% até 2060, principalmente pela menor expansão da população em idade ativa. Por sua vez, a taxa de crescimento potencial dos emergentes membros do G20 cai de 4,5% por ano antes de 2020 para cerca de 3% na metade de 2030 e abaixo de 2% por volta de 2060, em meio a desaceleração do crescimento da eficiência da mão de obra.
Embora desacelerando, a tendencia de crescimento potencial de economias emergentes continuará mais alto do que no caso dos desenvolvidos, significando que os emergentes vão continuar a aumentar sua fatia na produção global. As contribuições da China e da India já dominam o crescimento mundial, mas a projeção é de que a India vai superar a China nesse aspecto no final da década de 2030 (4,5% de crescimento ante 4,3%), em parte porque a população chinesa em idade de trabalhar vai cair cerca de 1,25%.
O crescimento real do PIB per capita nos países da OCDE permanece em torno de 1,5% ao ano, bem abaixo das normas históricas. E desacelera na maioria dos emergentes do G20, exceto naquelas em que o desempenho recente foi relativamente fraco como Argentina, Brasil e África do Sul.
No Brasil, o PIB real per capita é projetado para crescer 1,1% ao ano entre 2020-2030, e acelerar para 2,4% ao ano entre 2030-2060. Isso é impulsionado principalmente por uma melhora da produtividade (tendência de eficiência da mão de obra). No mesmo período, o PIB per capita na Argentina pode passar de 0,4% para 2,2%.
Nesse cenário de base, as emissões globais de CO2 provenientes do uso de energia permanecem nos níveis atuais, fracassando em cumprir a ambição do Acordo de Paris da ONU de limitar o aquecimento a 1,5°C.
Por sua vez, no cenário de transição energética, todos os países aceleram sua transição a partir de 2026, eliminando o carvão como fonte de energia até 2050 e reduzindo a participação do petróleo para 5% da energia primária e e do gás para 10%. Esse cenário é compatível com o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C.
Conforme o estudo, abstraindo os ganhos vindos da prevenção de danos ambientais, essa aceleração da transição energética resulta em choque negativo na oferta. O crescimento global desacelera em cerca de 0,2 ponto percentual (pp) por ano inicialmente e 0,6 pp no final do período de transição.
A desaceleração é mais modesta nos países da OCDE, quase todos desenvolvidos, mas é mais acentuada entre os emergentes do G20, por causa de maior intensidade de carbono em suas economias.
Pela projeção, até 2050 os custos cumulativos de mitigação seriam de 3,7% do PIB comparado ao cenário de base nos países da OCDE e de 11% do PIB para as economias emergentes do G20, ou seja, três vezes maior. O aumento forte e antecipado do investimento necessário para a transição energética poderia reduzir o crescimento anual do consumo privado em 0,2 a 0,3 pp na primeira década da transição.
Para o Brasil, a projeção aponta queda acumulada de 6% na produção potencial de agora até 2050, comparado a reduções acumuladas de cerca de 14% na Argentina, 15% na Africa do Sul, 12% na Colômbia, quase 10% na India, por volta de 7% na China e México.
‘O Brasil sofre menos quando se olha a redução de crescimento, comparado a outros países com economias mais carbonizadas’, diz Guillemette. ‘A baixa do crescimento no Brasil é maior que nos países da OCDE, mas menor que em outros emergentes’.
O forte, embora em desaceleração, crescimento da produtividade na Índia, na China e na Indonésia reflete o desempenho recente e leva a uma notável recuperação do PIB per capita nesses países quando comparados aos Estados Unidos. No entanto, na Índia o PIB per capita ainda será inferior a 40% do nível dos EUA em 2060 e, na China ficará em cerca de metade.
Nas outras grandes economias emergentes do G20, como o Brasil, Argentina, e África do Sul, apesar da hipótese de aceleração gradual, o desempenho relativamente fraco do crescimento da produtividade nos últimos anos implica uma convergência mais modesta para os padrões de vida dos EUA nos próximos 40 anos.
O padrão de vida brasileiro é calculado em apenas 24% daquele dos EUA em 2023 e passaria para 35% em 2060 em Paridade de Poder de Compra (PPC), informa Guillemette. Dois anos atrás a OCDE projetava que o Brasil não chegaria a mais de 27% do padrão de vida americano nos próximos 40 anos.
Argentina, México, Colombia, Indonésia, China terão padrão de vida maior que o brasileiro em 2060 em relação aos EUA, segundo a projeção.